joi, 21 mai 2009

A Frágil liberdade de circulação de pessoas e a gripe suína

Por Rui Aurélio De Lacerda Badaró
Presidente da Sidetur - Sociedade Íbero-Americana de Direito do Turismo
Presidente do IBCDTur - Instituto Brasileiro de Ciências e Direito do Turismo

A crescente preocupação da OMS – Organização Mundial da Saúde face a disseminação do vírus Influenza A H1N1, apelidado de Gripe Suína, evidenciou novamente as discussões sobre a liberdade de circulação de pessoas e o direito subjetivo dos Estados em definir quem é ou não é apto para adentrar seus respectivos territórios.
A liberdade de circulação de pessoas enquanto princípio jurídico não é fenômeno novo, ao contrário disso, desde o conhecimento da soberania dos Estados, no século XVII, diversos foram os estudos versando sobre a temática, todos com o compromisso de harmonizar duas idéias antagônicas para a garantia da liberdade de locomoção: a) o Direito a autodeterminação pessoal (direito do indivíduo dispor de sua própria pessoa); e b) o Direito de controle das migrações pelo Estado (objetivando impedir um possível despovoamento ou a entrada de elementos perigosos).
A livre circulação internacional de pessoas foi objeto da Declaração Universal dos Direitos do Homem da ONU, de 1948, que consagrou pela primeira vez, de modo solene o princípio da livre circulação (Art. 13) reconhecendo-o como regra jurídica. Em 1966, o Pacto internacional sobre direitos civis e políticos confirmou o princípio da liberdade de locomoção internacional (Art. 12) e frisou que a dita liberdade “...não poderia ser alvo de restrições, salvo quando estas se encontrarem previstas em lei e forem necessárias para proteger a segurança nacional, a ordem, a saúde e a moral pública...”
Logo, a saúde pública pode representar uma limitação direta à liberdade de circulação de pessoas, para se evitar a difusão de moléstias contagiosas e a propagação de epidemias. Nesse sentido, a cooperação em matéria sanitária e de saúde tem sido positiva, dado que a maioria dos Estados encontram-se vinculados a regulamentação de saúde e sanitária da OMS, em razão das quais a pessoa pode ser impedida de entrar ou sair de um determinado país.
No caso da Gripe A, a OMS elevou o nível de alerta de 4 para 5 no dia 29 de abril de 2009, o que causou preocupação na Sociedade internacional, levando diversos países (Argentina, Peru, Equador, Cuba, dentre outros) a suspenderem vôos para o Mexico, bem como oriundos do Mexico (epicentro da Gripe A), restringindo assim, a liberdade de circulação de pessoas, sob o argumento de evitar a propagação da doença, ou ainda sua transformação em pandemia.
Todavia a OMS não orientou nenhum país nesse sentido! Ao contrário: manifestou-se contrária à suspensão de vôos, restrição de viagens ou fechamento de fronteiras, uma vez que essa medida teria pouco efeito no sentido de barrar o vírus, num cenário em que já ocorreu sua disseminação. Explica ainda a OMS que os níveis de alerta (os níveis 1 a 3 concernem a preparação, notadamente das atividades, do desenvolvimento dos meios de ação e planejamento das intervenções, enquanto que os níveis 4 a 6 indicam claramente a necessidade do empreendimento de esforços de resposta contra a pandemia e atenuação de seus efeitos) servem para que ocorra uma efetiva coordenação internacional no sentido de que os Estados restem preparados para enfrentar pandemias.
Medidas restritivas à liberdade de circulação de pessoas que não respeitem o previsto nas regras de saúde e sanitárias da OMS, bem como no Pacto Internacional sobre direitos civis e políticos de 1966 e a própria Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, encontram-se em dissonância com o Direito Internacional. Pior: Tais medidas geram conseqüências negativas sob o aspecto social, econômico e político, vez que evidenciam o individualismo de alguns Estados, contribuindo para o esfacelamento do bom relacionamento internacional, baseado na regra jus-internacionalista Commitas gentium (cortesia internacional).
Em tempo:. Posturas restritivas adotadas hoje, poderão refletir em um recrudescimento das relações internacionais amanhã. É necessário?!?