marți, 3 septembrie 2013

A indemnização por férias estragadas




A indemnização do dano moral decorrente de férias estragadas está prevista na recentemente divulgada proposta da Comissão (COM2013-512) para a substituição da Directiva 90/314/CEE (viagens organizadas / pacotes turísticos), constituindo mais uma etapa da progressiva afirmação da autonomia deste dano. Como se refere no ponto 29 a compensação a atribuir ao viajante “deve também cobrir qualquer dano imaterial, em particular no caso de férias estragadas”.

De harmonia com o proposto art.º 12º, sob a epígrafe redução de preço e compensação por danos, o nº 2 estatui: O viajante terá direito a receber uma indemnização do organizador por qualquer dano, incluindo o dano moral, que demonstre ter sofrido em resultado de qualquer desconformidade com a viagem adquirida”.

Esta consagração decorre, como se refere na proposta da Comissão, da importante decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) no caso Simone Leitner contra um operador turístico alemão: Article 12 contains provisions on price reductions related to lack of conformity and to alternative arrangements resulting in a package of lower quality, as well as on damages. In accordance with the Court's ruling in Case C-168/00 Simone Leitner, paragraph 2 clarifies that also non-material damage has to be compensated".

O acórdão do TJUE, de 12 de Março de 2002,  incidiu sobre o artº 5º da Directiva 90/314/CEE aplicado a uma viagem, em regime de pensão completa, da família Leitner durante 14 dias num clube turístico da Turquia. Decorrida uma semana, a menor Simone Leitner sofreu uma intoxicação por salmonela provocada pela alimentação fornecida pelo clube, situação que ocorreu com outros clientes. Para além da jovem,  os pais que dela tiveram que cuidar, ficaram com a última semana de férias estragada. Não tendo o operador turístico atendido a sua reclamação, intentaram uma acção num tribunal austríaco que apenas concedeu uma indemnização pelo sofrimento físico associado à intoxicação alimentar  - acessos de febre durante vários dias, perturbações circulatórias, diarreia, vómitos, bem como ansiedade -  mas não considerou que o dano moral decorrente do gozo de férias pudesse ser indemnizado pelo direito austríaco.

O tribunal de recurso (Landgericht Linz), embora concordando com o tribunal de primeira instância quanto ao direito austríaco, admitiu que o artº 5º da Directiva pudesse impor diferente solução, pelo que remeteu a questão para o tribunal europeu. O TJUE decidiu que o mencionado preceito deve ser interpretado no sentido de conferir, em princípio, ao consumidor um direito à reparação do dano moral resultante da não execução ou da incorrecta execução das prestações incluídas numa viagem organizada.

Também o Codice del Turismo, aprovado em Itália em 2011, estabelece que em caso de incumprimento ou deficiente execução das prestações que integram o pacote turístico que não sejam de escassa importância, o turista pode obter, independentemente da resolução do contrato, o ressarcimento dos danos relativos ao tempo de férias gasto inutilmente e à irrepetibilidade da ocasião perdida.

Os alemães já alguns anos consagram no seu Código Civil de forma mais genérica a indemnização por férias estragadas, referindo-se no § 651f/II do BGB o dano por uso sem utilidade do tempo de férias.

Entre nós, o Tribunal da Relação de Coimbra (3ª Secção Cível) de 12/6/2011 decidiu o caso de dois casais e os respectivos filhos que adquiriram uma viagem organizada para a República Dominicana, incluindo o preço a deslocação, alojamento e alimentação. Chegados ao destino, depararam-se com uma praia deserta e ao entrarem na água - afinal escura ao invés de límpida e transparente como surgia na brochura em que haviam formado a sua escolha - várias pessoas do grupo, incluindo crianças, foram picadas por alforrecas, o que as obrigou a receber tratamento médico e lhes causou generalizado receio em reentrar no mar. Considerou o tribunal que a ausência de informação por parte do operador turístico num “pacote era quase exclusivamente a praia, há cumprimento defeituoso se, devido à cor escura da água e à presença de alforrecas, os clientes da agência de viagens ficam impedidos de usufruir da praia”. Mais especificamente considerou que em virtude do “cumprimento defeituoso, os clientes se sentiram revoltados, frustrados, desiludidos, emocionalmente desgastados e desgostosos, está-se perante o já denominado «dano das férias estragadas», de natureza não patrimonial, mas de gravidade suficiente para merecer a tutela do direito”.

Carlos Torres, Turisver de 5 de Setembro, pág.6