O tribunal europeu entende que o regime da margem pode ser aplicado nas vendas b2b e não apenas b2c como sustentava a Comissão. Portugal respeita o quadro europeu enquanto Espanha terá de alterar a sua legislação sobre o IVA das agências de viagens.
Os acórdãos do Tribunal de Justiça da União
Europeia (TJUE), de 26 de Setembro de 2013, foram proferidos na sequência de
vários processos instaurados pela Comissão individualmente contra oito
Estados-membros, dentre os quais o nosso país: Espanha (processo C-189/11), Polónia
(C-193/11), Itália (C-236/11), República Checa (C-269/11), Grécia (C-293/11),
França (C-296/11), Finlândia (C-309/11) e Portugal (C-450/11). A questão
central em todos os processos respeita à legalidade do denominado b2b (business to business)
suscitada pela Comissão que entendia ser o regime
especial de IVA das agências de viagens restrito às relações destas
empresas com o consumidor final (b2c).
As agências de viagens encontram-se submetidas a
um regime especial de IVA - o denominado regime da margem também
conhecido por TOMS (tour operators margin
scheme) – que figura actualmente
nos artigos 306º a 310º da Directiva
2006/112/CE do Conselho de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema
comum do imposto sobre o valor acrescentado (vulgarmente conhecida por
Directiva do IVA).
O regime da margem, à luz do direito comunitário, assenta em dois
requisitos fundamentais (art.º 306º): 1º) As agências de viagens /
operadores turísticos actuarem em nome próprio perante os clientes,
aplicando-se o regime geral do IVA
quando surjam nas vestes de intermediárias; 2º) Utilizarem, para a
realização da viagem, entregas de bens (mala-brinde, camisolas, pastas
do congresso, material desportivo v.g bolas de golfe) e prestações de
serviços (avião, autocarro, guia, transferista, hotel etc.) efectuadas por outros
sujeitos passivos. Se os bens ou serviços pertencerem à agência de viagens
aplica-se o regime geral.
Os vários serviços que a agência de viagens
adquire a terceiros, designadamente à
companhia aérea, à transportadora rodoviária, aos profissionais de informação
turística e à entidade exploradora do hotel, são consideradas como uma única
prestação de serviços realizada pela agência de viagens ao cliente
(art.º307º).
Para além do objectivo de simplificação, o sistema da margem visa a neutralidade do imposto no espaço da União Europeia, que o IVA que
a agência de viagens pagou aos prestadores de serviços doutros Estados-membros fique
nesses países, pelo que correspondentemente se exclui o direito à dedução
ou reembolso (art.º 310º). Exemplificando: num pacote dum operador
turístico português que tem como destino Espanha, França e Itália, o IVA que os
hotéis, restaurantes, museus e espectáculos lhe debitaram fica em cada um
desses países e consequentemente não é dedutível nem reembolsável
pela empresa portuguesa.
No Estado-membro em que a empresa se encontra sedeada
(art.º 306º), o IVA não incide sobre
a totalidade do serviço, como é comum, mas apenas sobre a margem
do operador turístico: a diferença entre o montante total, líquido de IVA, pago
pelo cliente e o custo efectivo suportado pela agência de viagens relativo às
entregas de bens (brochuras, malas, sacos ou outros brindes oferecidos ao
cliente) e às prestações de serviços (alojamento, transporte, alimentação,
visitas a monumentos, espectáculos etc.) efectuadas por outros sujeitos
passivos exigindo-se que tais operações tenham sido efectuadas em benefício
directo do cliente.
É apenas a base do
imposto que é reduzida, sendo aplicável a taxa normal.
O desfecho dos processos era previsível desde as conclusões da advogada-geral Eleanor
Sharpston, apresentadas em 6 de Junho de 2013 - abrangendo os oito
Estados-membros dada a matéria a decidir ser comum a todos - porquanto apesar
de não terem natureza vinculativa os juízes acolhem-nas em cerca de 80% dos
casos.
As acções foram julgadas improcedentes contra sete
Estados membros, incluindo Portugal mas relativamente a Espanha o TJUE acolheu
os argumentos avançados pela Comissão.
Em primeiro lugar, a desconformidade com o
Direito Comunitário quando a legislação espanhola exclui do regime
especial as vendas de viagens organizadas por agências grossistas mas
efectuadas por agências retalhistas, exclusão
que não se encontra prevista na Directiva.
Em segundo lugar, a lei espanhola permite que
agência de viagens, após ter consultado o cliente, mencione na factura «IVA
incluído no preço» que se reporta a uma determinada percentagem do preço que é
normalmente da responsabilidade do cliente e que este pode deduzir. Para
além desta dedução estar expressamente excluída do regime da margem tem a
agravante de se restringir aos serviços que são prestados em território
espanhol.
Por último, a determinação de forma global da
matéria colectável da margem não tem qualquer fundamento na Directiva que
se reporta a cada prestação fornecida pelas agências de viagens.
Espanha terá agora de corrigir a sua
legislação erradicando os aspectos censurados pelo TJUE.
Carlos Torres, Turisver de 5 de Dezembro de 2013, pág.6