marți, 22 octombrie 2013

Director de hotel: Estado viola grosseiramente o princípio da confiança



Em 2008 com o novo regime jurídico dos empreendimentos turísticos (RJET) aprovado pelo Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março, ampliou-se significativamente a exigência legal do director de hotel. Anteriormente confinada a  hóteis ou aparthóteis de cinco estrelas ou acima de 100 unidades de alojamento estendeu-se a todos os empreendimentos turísticos entre três e cinco estrelas. Prescindiu-se até de um número mínimo de unidades de alojamento.
Num triénio o esforço de qualificação induzido pelo RJET foi significativo abrangendo um elevado número de profissionais do sector e de estabelecimentos de ensino superior e outros que ofereceram cursos de graduação.
Importa também notar que na vertente do ensino superior do turismo durante aproximadamente trinta anos muitos jovens disputaram os cursos de gestão hoteleira precisamente os que maiores médias de ingresso (17 valores) exigem nas nossas escolas de referência.
No fase final da anterior governação, sem qualquer justificação plausível, o Decreto-Lei nº 49/2011, de 8 de Abril, eliminou os requisitos de acesso à profissão de director de hotel revogando o Decreto-Lei nº 271/82, de 13 de Julho, uma iniciativa de sinal diametralmente oposto com a exigência de qualidade dos recursos humanos plasmada no RJET.
Ainda na oposição, PSD e CDS haviam criado uma forte expectativa no sentido de requerem a apreciação parlamentar do referido diploma legal, iniciativa que se esboroou com a dissolução da Assembleia da República e a ascensão a cargos governamentais dos parlamentares envolvidos designadamente Pedro Mota Soares um dos mais activos neste domínio. 
Circula agora uma iniciativa legislativa – o secretismo legiferante continua a infelizmente a dominar a prática dos nossos governantes - que elimina o nº 2 do art.º 47º do RJET preceito que atribui a responsabilidade operacional dos empreendimentos turísticos de cinco, quatro e três estrelas a um funcionário habilitado ao exercício da profissão de director de hotel.
Impõe-se tomar consciência do enorme erro que tal revogação representa. Como é possível prescindir de uma formação altamente especializada numa componente tão importante da oferta turística como a do alojamento? Licenciados em cursos de topo associados a uma elevada exigência de ingresso poderão continuar a confiar num Estado que de um dia para o outro os coloca a competir com profissionais sem a mínima qualificação? Como se podem compreender sinais tão contraditórios em tão curto hiato?
Afigura-se que à luz do interesse público deve exigir-se um conjunto de conhecimentos especializados obtidos num curso superior de gestão hoteleira ou através de um percurso profissional sedimentado num razoável de número de anos complementado por um curso de graduação.
Fazer tábua rasa desta exigência não é compatível com uma política de turismo digna desse nome, a qual deve assentar numa forte qualificação dos recursos humanos e respeitar todo o historial de investimentos públicos e pessoais na aquisição desses conhecimentos.

Carlos Torres, DirHotel nº 12/2003, pág .10 – (Síntese da intervenção no Congresso da ADHP realizado na ESHTE em 11 de Outubro de 2013)

A nova legislação das agências de viagens de Cabo Verde




No painel dedicado à distribuição no VI Encontro Internacional de Turismo serão debatidos algumas temas como o controverso sistema de reservas proposto pela IATA (New Distribution Capability), as propostas de reforço dos direitos dos passageiros do transporte aéreo, o alargamento da protecção dos consumidores às viagens assistidas e, de forma destacada, a nova legislação das agências de viagens.

O acesso à actividade é permitido não só a sociedades comerciais mas também a pessoas singulares e assenta na clássica distinção entre actividades próprias (organização e venda de viagens turísticas, reservas em empreendimentos turísticos, bilheteria, transferes e assistência a turistas) e actividades acessórias (passaportes, organização de congressos, operações cambiais, rent-a-car, seguros de viagem e transporte turístico).

O princípio da exclusividade ou monopólio legal determina que apenas as agências de viagens podem licitamente exercer as actividades próprias embora existam excepções: a reserva de serviços num empreendimento turístico é uma actividade própria e como tal reservada legalmente aquelas empresas mas o legislador excepciona naturalmente a comercialização directa dos seus serviços pelos empreendimentos turísticos.

O legislador reparte estas empresas por uma classificação tripartida: 1) agência de viagens e turismo (podem exercer, em Cabo Verde ou no estrangeiro, todas as actividades próprias e vendem directamente ao público); 2) agência de turismo (confinadas a Cabo Verde, vendem ao público não todas as actividades próprias - apenas viagens turísticas e reservas em empreendimentos turísticos - e igualmente limitadas a algumas actividade acessórias) e, finalmente; 3) operador turístico (ao contrário das duas categorias anteriores não podem vender directamente ao público, consistindo a sua actividade na elaboração de pacotes turísticos dentro ou fora do território nacional, estando-lhes, no entanto, vedada a actividade própria de recepção, transferência e assistência a turistas).

Trata-se de uma classificação estanque, não cumulativa, isto é, as empresas só podem ter uma categoria, ocorrendo em caso de mudança de categoria uma nova licença e substituição do alvará, correspondendo grosso modo à distinção entre grossistas (os operadores turísticos) e retalhistas (abrangendo as duas primeiras categorias).      

Na linha do princípio da exclusividade as denominações correspondentes às apontadas três categorias só podem ser utilizadas pelas empresas licenciadas e inscritas no Sistema Nacional de Turismo (SIT) nessa precisa categoria.

Estabelecem-se seis requisitos de acesso à actividade: 1º) situação regularizada perante o fisco/segurança social; 2º) capital próprio positivo; 3º) idoneidade comercial (excluída quando ocorra falência anterior do titular, dos administradores, gerentes ou directores técnicos); 3º) director técnico; 4º) caução; e, por fim, 5º) seguro de responsabilidade civil.  Estes dois últimos mecanismos de protecção do consumidor inspiram-se na exigente disciplina europeia constante da Directiva 90/314/CEE.

Para as pessoas colectivas o capital social mínimo varia: mais elevado para os operadores turísticos (10 000 000,00), metade para as agências de viagens e turismo (5 000 000,00) e substancialmente reduzido para as agências de turismo (2 500 000,00).

A exclusividade das instalações e outros aspectos constantes do diploma motivarão certamente o interesse e reflexão dos participantes no VI EITU. 


Carlos Torres, publicado em A SEMANA (Cabo Verde), de 20 de Outubro de 2013

Locação turística de apartamentos: a crescente concorrência à hotelaria tradicional




Um significativo número de sites – com maior destaque Airbnb, HomeAway, Homelidays -  permitem aos turistas visualizar com bastante detalhe e reservar on line por curtos períodos, mesmo um só dia, apartamentos em cidades e vilas europeias que pretendem visitar, uma oferta que também contempla Lisboa.  As webs p2p (peer to peer, de igual a igual),  permitem aos proprietários de imóveis  arrendar apartamentos, moradias ou até simples quartos a outros particulares, com ou sem serviços. A rentabilidade destas webs resultam de comissões que cobram por cada transacção e/ou das receitas de publicidade.
Os inconvenientes normalmente associados a este tipo de oferta de alojamento a turistas são as maiores possibilidades de fuga aos impostos pelos proprietários desses imóveis comparativamente à hotelaria tradicional, pois os utentes não pedem normalmente recibo. Esta evasão fiscal representa uma perda de receitas para o Estado, que ao invés as arrecadaria no alojamento classificado (IVA, IRC das entidades exploradoras, IRS dos trabalhadores etc.) mas também dos próprios estabelecimentos hoteleiros que sofrem uma concorrência desleal por via fiscal.

Esta oferta locativa suscita também oposição por parte da hotelaria tradicional que alerta não só para a degradação dos preços  mas também para a concorrência desleal resultante das maiores exigências às entidades exploradoras em salários e no cumprimento de requisitos de segurança, conservação e serviços obrigatórios.
Em termos de política de urbanismo a locação turística suscita igualmente algumas reservas porquanto os proprietários ao retirarem apreciáveis rendimentos da locação turística fazem disparar os preços dos imóveis no centro das cidades, tendo como consequência a inexistência de fogos para habitação nessas zonas. Ocorrem também conflitos entre os condóminos determinados por inúmeras pessoas desconhecidas a entrar no prédio, maior desgaste e estragos nas partes comuns causados pelas malas e outro tipo de incidentes.
Ainda recentemente, em França, o maior destino turístico mundial, a ministra da habitação Cécile Duflot alertava para que a transformação de residências para a locação turística (meublés touristiques) pode constituir “um problema para os territórios onde a pressão sobre o mercado de arrendamento já é forte e parte dos imóveis pode escapar para o turismo".
Duas câmaras têm sido bastante activas neste domínio. Do lado de lá do Atlântico, a câmara de Nova York provocou a condenação de um proprietário que havia arrendado o seu apartamento, na plataforma Airbnb, a uma multa de 2 400 dólares, pelo exercício ilegal da actividade hoteleira. Na mesma linha, o supremo tribunal de Nova York ordenou o encerramento de smartapartments.com, considerando que estava a alojar turistas em estabelecimentos ilegais o que poderia causar danos consideráveis aos hóspedes e a terceiros.
Mais significativamente, em França, um juiz parisiense condenou por iniciativa da mairie a proprietária de quatro imóveis, a Sra. Halabi, a uma multa de 35 000€ e a reposição no prazo de dois meses da finalidade habitacional com uma sanção compulsória de 200€ diários por apartamento. Na audiência o procurador da república relatou que na sequência de um inquérito levado a cabo pelas entidades policiais que se ocupam da mudança de uso habitacional dos imóveis, ficou demonstrado que três apartamentos pertencentes à Sra. Halabi e o último  a uma sociedade imobiliária sob a forma civil (CCCW) de que a referida senhora  é gerente, sendo imóveis destinados a habitação haviam sido transformados para arrendamentos de férias de curta duração o que implica uma alteração do uso.

Em Setembro último, a Assembleia nacional francesa aprovou um novo enquadramento da actividade. 

Em Espanha,  o problema afecta milhares de moradias e apartamentos pelo que o Congresso aprovou em Maio uma modificação da Ley de Arrendamientos Urbanos, determinando que a locação turística será regulada ao nível das comunidades autónomas. Astúrias, Baleares, Catalunha e Valencia disciplinaram a matéria estabelecendo um conjunto de requisitos e a obrigatoriedade de registo.

Entre nós, o  problema coloca-se a partir do art.º 43º do RJET e, sobretudo, na grande amplitude da figura do alojamento local.  O nº 1 do art.º 43º do RJET reparte o alojamento turístico por duas alternativas: os empreendimentos turísticos e o alojamento local. Sucede que com uma simples licença de habitação o proprietário pode proceder ao registo do imóvel no alojamento local. Por outro lado, se não prestar serviços de recepção - bastando para o efeito fornecer um código de acesso ao apartamento - não se verifica a presunção de alojamento turístico constante do nº 2 do art.º 43º do RJET.

Também por esta razão não se compreende o que impede o SET de promover a rápida publicação de um enquadramento mais restritivo do alojamento local. Ironicamente estamos perante a antítese de um liberal: perturba as empresas  promovendo sucessivas versões de inúmeras e duvidosas alterações ao RJET que ninguém solicitou e tarda inexplicavelmente no enquadramento restritivo do alojamento local há muito reivindicado pela hotelaria.

Para já não falar do Código do Turismo constante do Programa do Governo – ainda para mais uma iniciativa originária do programa eleitoral do CDS -  de que não se conhece sequer um esboço.

Carlos Torres, Publituris de 18 de Outubro de 2013, pág. 4