A posição que tem estado a ser
defendida de que a greve da TAP constitui um caso de força maior,
isentando a companhia aérea de qualquer responsabilidade, não me parece aceitável.
Em primeiro lugar, os passageiros
têm direitos que devem ser assegurados, designadamente o reembolso do preço
total da compra do bilhete, no prazo de sete dias, devendo ser pago em numerário,
transferência bancária electrónica, de ordens de pagamento bancário ou de
cheques bancários (art.º 8º/1 do Regulamento (CE) nº 261/2004 do Parlamento
Europeu e do Conselho de 11 de Fevereiro de 2004).
O reembolso só pode realizar-se
através de vales de viagem e/ou outro serviços com o acordo escrito do
passageiro, sendo ilegal o crédito forçado para outra viagem agora
imposto pela companhia aérea, contrastando, aliás, com a sua tradição de
reembolsos em greves anteriores.
Se tivesse sido observado este
aspecto, uma boa parte dos problemas surgidos por viagens marcadas antes do pré-aviso
de greve poderiam já estar resolvidos. As agências de viagens em diálogo com os
seus clientes, teriam transferido os voos para outras companhias aéreas.
Em segundo lugar, também não
parece aceitável que os viajantes afectados no voo de regresso pela eventual greve não tenham
direitos. Desde logo, o art.º 9º assegura-lhes, a expensas da companhia aérea,
o alojamento em hotel caso se torne necessária a sua estadia forçada por
uma ou mais noites.
No Regulamento 261/2004, tal como
na Convenção de Montreal, as greves que afectam o funcionamento das companhias
aéreas podem constituir circunstâncias extraordinárias. No entanto, como
decidiu o Tribunal de Justiça da União Europeia “o legislador comunitário não considerou que esses eventos,
cuja lista, aliás, é apenas exemplificativa, constituem em si mesmos circunstâncias
extraordinárias, mas apenas que são susceptíveis de produzir semelhantes
circunstâncias. Daí resulta que todas as circunstâncias que rodeiam esses
eventos não são necessariamente causas de isenção da obrigação de indemnizar
prevista no artigo 5.°, n.° 1, alínea c), desse regulamento.” (Processo Friederike
Wallentin‐Hermann
contra Alitalia). Uma coisa será uma greve de controladores aéreos outra
totalmente diferente a afectação dos passageiros provir dos funcionários da
companhia aérea, como sucede nesta situação extrema e muito delicada em que
pilotos que se pretendem apropriar duma parte do capital da transportadora
aquando da sua privatização (pode inclusivamente motivar uma acção desta última
contra o sindicato em ordem ao ressarcimento dos prejuízos decorrente do abuso
do direito de greve).
Neste momento complicado para
muitos clientes das agências de viagens, o que importa referir é que não se
pode distorcer tão grosseiramente o quadro legal de protecção dos consumidores.
Nuns casos há que cumprir as regras do reembolso permitindo a opção por outras
transportadoras aéreas de molde a concretizar-se a projectada viagem, noutros a
TAP tem que assegurar o pagamento dos hotéis aos clientes apanhados no destino pela concretização da
greve. Existem outros direitos mas estes são básicos e não podem ser
postergados!
Estando em revisão na União
Europeia o Regulamento nº 261/2004
bem como a Directiva 90/314/CEE relativa aos pacotes turísticos, no sentido de
maximizar a protecção do consumidor é, no mínimo estranho, que entre nós se
veiculem, ao mais alto nível, posições de desresponsalização dos prestadores de
serviços, sem qualquer suporte legal desde, pelo menos, a década de noventa.
Carlos
Torres, 25 de Abril de 2015