Um significativo número de sites – com maior
destaque Airbnb, HomeAway, Homelidays - permitem aos turistas visualizar com bastante
detalhe e reservar on line por curtos
períodos, mesmo um só dia, apartamentos em cidades e vilas europeias que
pretendem visitar, uma oferta que também contempla Lisboa. As webs
p2p (peer to peer, de igual a igual), permitem
aos proprietários de imóveis arrendar apartamentos, moradias ou até simples
quartos a outros particulares, com ou sem serviços. A rentabilidade destas webs
resultam de comissões que cobram por cada transacção e/ou das receitas de
publicidade.
Os inconvenientes normalmente associados a
este tipo de oferta de alojamento a turistas são as maiores possibilidades de fuga aos impostos pelos proprietários
desses imóveis comparativamente à hotelaria tradicional, pois os utentes não
pedem normalmente recibo. Esta evasão fiscal representa uma perda de receitas
para o Estado, que ao invés as arrecadaria no alojamento classificado (IVA, IRC
das entidades exploradoras, IRS dos trabalhadores etc.) mas também dos próprios
estabelecimentos hoteleiros que sofrem uma concorrência desleal por via fiscal.
Esta oferta locativa suscita também
oposição por parte da hotelaria tradicional que alerta não só para a degradação
dos preços mas também para a
concorrência desleal resultante das maiores exigências às entidades
exploradoras em salários e no cumprimento de requisitos de segurança, conservação
e serviços obrigatórios.
Em termos de política de urbanismo a locação turística suscita igualmente
algumas reservas porquanto os proprietários ao retirarem apreciáveis
rendimentos da locação turística fazem disparar os preços dos imóveis no centro
das cidades, tendo como consequência a inexistência de fogos para habitação
nessas zonas. Ocorrem também conflitos entre os condóminos determinados por inúmeras
pessoas desconhecidas a entrar no prédio, maior desgaste e estragos nas partes
comuns causados pelas malas e outro tipo de incidentes.
Ainda recentemente, em França, o
maior destino turístico mundial, a ministra da habitação Cécile Duflot alertava para que a transformação de residências para a
locação turística (meublés touristiques)
pode constituir “um problema para os territórios onde a pressão sobre o mercado
de arrendamento já é forte e parte dos imóveis pode escapar para o
turismo".
Duas câmaras têm sido bastante
activas neste domínio. Do lado de lá do Atlântico, a câmara de Nova York provocou
a condenação de um proprietário que havia arrendado o seu apartamento, na
plataforma Airbnb, a uma multa de 2 400 dólares, pelo exercício ilegal da
actividade hoteleira. Na mesma linha, o supremo tribunal de Nova York ordenou o
encerramento de smartapartments.com, considerando que estava a alojar turistas em
estabelecimentos ilegais o que poderia causar danos consideráveis aos hóspedes
e a terceiros.
Mais significativamente, em França, um juiz
parisiense condenou por iniciativa da mairie
a proprietária de quatro imóveis, a Sra. Halabi, a uma multa de 35 000€ e a
reposição no prazo de dois meses da finalidade habitacional com uma sanção
compulsória de 200€ diários por apartamento. Na audiência o procurador da
república relatou que na sequência de um inquérito levado a cabo pelas
entidades policiais que se ocupam da mudança de uso habitacional dos imóveis,
ficou demonstrado que três apartamentos pertencentes à Sra. Halabi e o último a uma sociedade imobiliária sob a forma civil (CCCW)
de que a referida senhora é gerente, sendo
imóveis destinados a habitação haviam sido transformados para arrendamentos de
férias de curta duração o que implica uma alteração
do uso.
Em Setembro último, a Assembleia nacional
francesa aprovou um novo enquadramento da actividade.
Em Espanha,
o problema afecta milhares de moradias e apartamentos pelo que o
Congresso aprovou em Maio uma modificação da Ley de Arrendamientos Urbanos, determinando que a locação turística será regulada ao
nível das comunidades autónomas. Astúrias, Baleares, Catalunha e Valencia
disciplinaram a matéria estabelecendo um conjunto de requisitos e a
obrigatoriedade de registo.
Entre nós, o problema coloca-se a partir do art.º 43º do
RJET e, sobretudo, na grande amplitude da figura do alojamento local. O nº 1 do art.º 43º do RJET reparte o
alojamento turístico por duas alternativas: os empreendimentos turísticos e o
alojamento local. Sucede que com uma simples licença de habitação o proprietário pode proceder ao registo do
imóvel no alojamento local. Por outro lado, se não prestar serviços de recepção
- bastando para o efeito fornecer um código de acesso ao apartamento - não se
verifica a presunção de alojamento turístico constante do nº 2 do art.º 43º do
RJET.
Também por esta razão não se compreende o
que impede o SET de promover a rápida
publicação de um enquadramento mais restritivo do alojamento local. Ironicamente
estamos perante a antítese de um liberal: perturba as empresas promovendo sucessivas versões de inúmeras e
duvidosas alterações ao RJET que ninguém solicitou e tarda inexplicavelmente no
enquadramento restritivo do alojamento local há muito reivindicado pela
hotelaria.
Para já não falar do Código do Turismo constante do Programa do Governo – ainda para
mais uma iniciativa originária do programa eleitoral do CDS - de que não se conhece sequer um esboço.
Carlos Torres, Publituris de 18 de Outubro
de 2013, pág. 4