sâmbătă, 17 mai 2014

A recente proposta de um novo regime jurídico do alojamento local (RJAL)



"A proposta falha num aspecto essencial: onde exista uma oferta de empreendimentos turísticos suficiente ou excedentária deve travar-se o alojamento local. Em contrapartida, nos meios rurais, pode ser a única forma de estimular a oferta de alojamento. Finalidades meramente habitacionais devem ser excluídas desta figura criada em 2008 para integrar o alojamento clandestino, paralelo ou não classificado."




A proposta de um novo regime jurídico do alojamento local, apresentada pela SET,  em Abril de 2014, vem na sequência da recente revisão do RJET, seguindo-se uma breve panorâmica dessas alterações.

Na noção de estabelecimento de alojamento local refere-se expressamente o carácter ocasional ou regular dos serviços de alojamento temporário e estabelece-se, de forma inovadora, a proibição de opção facilitista por esta modalidade quando se verifiquem os requisitos para instalar um empreendimento turístico (art.º 2º). Se estão reunidos os requisitos para a instalação de um hotel, ainda que de uma estrela,  a maior facilidade decorrente de um simples processo de registo do alojamento local não pode prevalecer impedindo-se, assim, “a existência de empreendimentos turísticos trasvestidos de estabelecimentos de alojamento local” (preâmbulo).

Mantêm-se no art.º 3º as três tipologias do alojamento local: moradia, apartamento e estabelecimento de hospedagem constantes do RJET e da Portaria nº 517/2008, de 25 de Junho. Relativamente ao apartamento, que até agora equivalia a uma fracção autónoma, poderão doravante existir tantos quanto o número de divisões desta última.

O hostel não é autonomizado, constituindo uma simples denominação dos estabelecimentos de hospedagem, acrescendo os requisitos previstos  no art.º 15º.
 
Ocorre um excessivo alargamento do alojamento local, correspondendo à prestação de serviços de alojamento – não se referindo o carácter temporário nem se restringindo ao alojamento para turistas - por pessoas singulares ou colectivas (art.º 4º/1), estabelecendo-se duas presunções relativamente à existência, funcionamento ou intermediação desta modalidade autónoma num imóvel ou numa fracção.

A primeira respeita à divulgação do estabelecimento, ou seja à sua publicitação, disponibilização ou intermediação de um imóvel ou fracção por qualquer forma, entidade ou meio como alojamento para turistas ou alojamento temporário, enumerando-se exemplificativamente agências de viagens [art.º 4º/2/a)]. Uma informação na montra de um café, um anúncio num site ou num jornal de um quarto para quem visita a localidade ou nela vem trabalhar ou estudar conduz à formação da presunção.

A segunda presunção [art.º 4º/2/b)] assenta na existência de um espaço mobilado e equipado, no qual para além da dormida por períodos inferiores a 30 dias acrescem serviços complementares, exemplificando-se com a limpeza ou a recepção. Norma muito semelhante à consagrada no art.º 43º/2 RJET é, no entanto, mais abrangente porquanto a limpeza ou a recepção surgem agora com um carácter alternativo, bastando, assim, que se verifique uma delas.

A instalação num edifício constituído em propriedade horizontal deve observar o título constitutivo ou o regulamento de condomínio que podem proibir, limitar ou restringir a prestação de serviços de alojamento (art.º 4º/3). Deve, porém, preferir-se uma solução mais consentânea com os direitos dos condóminos, considerando-se que existe alteração do uso sempre que no título constitutivo esteja assinalada a essas fracções uma finalidade habitacional.

À semelhança da entidade exploradora e do responsável operacional dos empreendimentos turísticos, institui-se a figura do titular da exploração do alojamento local (art.º 5º), sobre o qual recai uma responsabilidade objectiva – independentemente da existência de culpa - pela reparação dos danos patrimoniais ou morais causados aos destinatários dos serviços ou a terceiros, designadamente aos condóminos ou ao locador. Complementarmente, institui-se um termo de responsabilidade.

Na linha dos registos públicos já existentes para as agências de viagens (RNAVT), empresas de animação turística (RNAAT) e empreendimentos turísticos (RNET), cria-se um registo nacional alojamento local (RNAL) mantido pelo Turismo de Portugal I.P., cuja inscrição mediante simples comunicação prévia é absolutamente indispensável para o exercício da actividade de alojamento (art.º 6º).

A autoridade turística nacional atribui um número de registo do estabelecimento de alojamento local que constitui o título de válido de abertura ao público (art.º 7º), sendo que a verificação dos requisitos é de instalação é da competência das câmaras municipais não se estabelecendo prazos apertados mas uma simples indicação de que  uma primeira vistoria seja realizada nos 60 dias subsequentes à atribuição do número de registo (art.º 8º), sancionando-se o incumprimento dos requisitos com o cancelamento do registo pelo presidente da câmara municipal (art.º 10º).

Estabelecem-se limites de capacidade – 15 de unidades de alojamento – exceptuando-se os hostels (art.º 12º), alguns requisitos básicos como a existência de água, esgotos e privacidade das instalações sanitárias, evacuação de fumos e gases nas cozinhas e permanente higiene e limpeza (art.º 13º), bem como requisitos de segurança contra riscos de incêndio atenuados nos estabelecimentos com capacidade inferior a 10 pessoas  (art.º 14º).

Os hostels surgem caracterizados por um número mínimo de quatro de unidades de alojamento em dormitório (art.º 15º), podendo, assim, dispor de quartos ou suites.

Na linha das recentes alterações ao RJET, podem instalar-se estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços (art.º 16º), sendo obrigatória a afixação de placa identificativa junto à entrada principal (art.º 18º), a existência do livro de reclamações (art.º 20º) e, exceptuando a matéria, urbanística a competência para a fiscalização é atribuída à ASAE (art.º 21º).

Carlos Torres, Dirhotel nº 14, Abril/Junho 2014, pág. 14