marți, 25 martie 2014

Dos hotéis sem classificação à solução da dispensa de requisitos como válvula de escape para projectos inovadores





“As recentes alterações ao RJET não permitem empreendimentos sem classificação ou categorias residuais. A preocupação do SET sobre os entraves a empreendimentos inovadores foi adequadamente resolvida através do mecanismo da dispensa de requisitos.”




1) A possibilidade originária ou superveniente de hotéis sem classificação

A par da eliminação das taxas pelas vistorias de classificação quando realizadas pelo Turismo de Portugal, I.P., uma das propostas mais emblemáticas do Secretário de Estado do Turismo para integrar as futuras alterações legislativas ao RJET consistia na introdução da possibilidade de os estabelecimentos hoteleiros não terem classificação. Ao lado de hotéis com a classificação de uma a cinco estrelas, introduzia-se a possibilidade de o empreendedor explorar hotéis sem tal menção se assim o desejasse. Facultava-se ao empreendedor poder prescindir – não apenas na fase de instalação do empreendimento turístico mas também quando este já se encontrasse em funcionamento com determinada classificação - da atribuição da categoria.

De harmonia com essa opção do empreendedor o empreendimento turístico ficaria isento de categoria na tipologia (estabelecimento hoteleiro) e grupo (hotéis, aparthotéis e pousadas), devendo, no entanto, observar os requisitos gerais de instalação e condições de acessibilidade previstos no RJET e em sede regulamentar na Portaria nº 327/2008, de 28 de Abril (estabelece os requisitos de classificação dos estabelecimentos hoteleiros, aldeamentos e apartamentos turísticos).  

Em Outubro de 2013, esta proposta estava cristalizada no art.º 34º do RJET do anteprojecto. Mantendo-se o conteúdo originário no nº 1, aditava-se um nº 2:  O interessado pode prescindir, na fase de instalação ou a todo o tempo, da atribuição da categoria, ficando, nesse caso, o empreendimento turístico isento de categoria na tipologia [estabelecimento hoteleiro] e grupo [hotel] respetivos, sem prejuízo da observância dos requisitos gerais de instalação e condições de acessibilidade previstos no presente diploma e dos requisitos referidos no nº 4 do artigo seguinte.”. Neste último caso, os empreendimentos turísticos podiam retirar da respectiva classificação a referência à categoria, através de mera declaração à autoridade turística nacional, operando-se, gratuitamente, a actualização do Registo Nacional dos Empreendimentos Turísticos (art.º 38º/9), devendo proceder à substituição da placa identificativa da classificação nos trinta dias subsequentes.

Tratando-se de uma das medidas mais importantes da projectada reforma legislativa, dela se dava nota, compreensivelmente, no preâmbulo do anteprojecto legislativo: “No processo de classificação, adopta-se um sistema facultativo no que à sua implementação diz respeito, cabendo aos promotores a decisão de sujeitar, ou não, o seu empreendimento turístico a determinada tipologia.”.


2) A proposta da criação de uma categoria residual como válvula de escape para situações inovadoras

As crescentes e adversas reacções associativas levam a uma alteração da proposta do SET. Em Novembro de 2013, o governante explica na pág. 36 do Publituris nº 1254 que “no caso da portaria de classificação, passará a haver uma categoria residual. Para o SET, trata-se de “uma espécie de válvula de escape, que permita o licenciamento de empreendimentos turísticos que, em virtude da sua inovação, segmentação, tematização ou requalificação, não encontrem acolhimento na actual portaria de classificação por estrelas”. A categoria, ainda sem nome definido, vai permitir ao hoteleiro “satisfazer as necessidades dos turistas que quer captar, e que nem sempre estão enquadradas no sistema de classificação que tem de respeitar”. O responsável sublinha que a introdução desta categoria vai permitir “que os empreendimentos possam, com qualidade, responder às novas tendências da procura, evitando que as actuais regras impeçam o surgimento da inovação e perturbem a competitividade”. Adolfo Mesquita Nunes afirma que não se trata de um sistema de classificação voluntária, em que um hoteleiro faz o hotel que quer, sem classificação. “O sistema de classificação manter-se-á e ninguém é obrigado a sair deste sistema”.

Este sistema é, numa forma coloquial, explicado pelo SET num documento dirigido às associações empresariais em 5 de Novembro de 2013: “Será ainda criada uma nova categoria, residual, que se apresenta como uma alternativa ao sistema de classificação de 1 a 5 estrelas. O nome desta categoria pode ser " S" ou " SD" ou qualquer outra letra ou conjunto de letras, ou outro elemento, sem significado especial, apenas como menção distintiva relativamente à da classificação por estrelas. Esta nova categoria constituirá uma válvula de escape para os promotores que, cumprindo as condições identificadas de seguida, entendam que a classificação de 1 a 5 estrelas, dados os requisitos exigidos, não seja uma mais-valia para o seu projecto ou obrigue a investimentos desnecessários face ao objectivo de satisfação dos turistas ou, ainda, impeça/dificulte/onere a requalificação necessária para a sua viabilidade. Um promotor poderá requerer ao Turismo de Portugal que lhe seja atribuída esta nova categoria desde que observadas 2 condições: i. Sejam cumpridos os requisitos obrigatórios exigidos a todos os empreendimentos turísticos; ii.  Cumpra com uma percentagem não inferior a um terço dos requisitos definidos (ou da pontuação que lhes estiver atribuída) numa lista criada para esta categoria independentemente 
do cumprimento de todos os outros requisitos opcionais.”



3) A inesperada solução da dispensa de requisitos

Muito se especulou sobre as motivações do SET para uma iniciativa tão controvertida. Uma delas respeitava à pressão de um segmento da hotelaria com duas ou três estrelas mas com uma marca internacional forte que teria por essa razão vantagem em afastar o sistema de classificação obrigatório entre uma e cinco estrelas. Evidenciavam a marca e podiam a partir das alterações legislativas ocultar a classificação.

Acredito, no entanto,  que a motivação política do SET esteja nos alegados entraves que o sistema coloca à “inovação, segmentação, tematização ou requalificação” pelo que a solução da dispensa de requisitos  constante do nº 7 do art.º 39º do RJET constitui a resposta legislativa mais adequada às preocupações do governante. 

Admitindo que existam esses casos empreendimentos inovadores que não se concretizam mercê do actual quadro regulamentar é pela via da dispensa de requisitos que se podem ultrapassar os obstáculos quando tal se mostrar apropriado, evitando cair no casuísmo ou no favorecimento. Um passo importante na preparação  das alterações à Portaria nº 327/2008, de 28 de Abril, é a inventariação de situações de inovação que nos últimos anos tenham esbarrado na regulamentação existente e a prognose de outras que possam vir a ocorrer. Feito esse trabalho de inventariação, ponderar os requisitos que podem ser dispensados para a obtenção de uma determinada classificação.

Naturalmente que estamos sempre perante classificações com carácter obrigatório entre 1 e 5 estrelas, pois as alterações ao RJET constantes do Decreto-Lei nº 15/2014, de 23 Janeiro, não permitem nem na letra nem no espírito empreendimentos sem classificação ou categorias residuais ombreando com empreendimentos classificados entre uma e cinco estrelas.  Pressinto, no entanto, que se trata de um trabalho difícil que vai absorver muitas energias e suscitar críticas.

A nova solução encontra-se, como não poderia deixar de ser,  reflectida no preâmbulo: “No processo de classificação, consagra-se a possibilidade de os requisitos para a categoria serem dispensados não apenas por apreciação da entidade administrativa, mas também verificados determinados critérios a concretizar em portaria.”.


Carlos Torres, Publituris nº 1262, de 7 de Março de 2014, pág. 6