vineri, 23 august 2013

A recente condenação da Ryanair por abuso de posição dominante




Em 14 de Junho de 2013, o tribunal de Milão (processo 7825/2013) decidiu, duma forma extensa e muito fundamentada, a acção proposta em 2010 pela Viaggiare s.r.l., uma agência de viagens on line contra a companhia aérea Ryanair Ltd.

Alegou a agência de viagens que a sua actividade é inteiramente legal, não violando qualquer direito de  propriedade intelectual sobre o site da companhia aérea low cost e que a pretensão da Ryanair de excluir qualquer intermediário das informações sobre os seus voos e da sua actividade comercial é ilícita, configurando ainda abuso de posição dominante sobre o mercado de venda de bilhetes de avião e de serviços de viagens e turismo ao nível nacional ou comunitário.

Por seu turno, alegou a Ryanair que a sua competitiva estratégia empresarial oferecendo aos clientes, com total segurança, directamente na fonte e sem pagar comissões a intermediários, foi aprovada pela Comissão Europeia e pela Irish Competition Authority.

Consideraram os juízes italianos não existir qualquer violação da marca porquanto a agência de viagens limita-se a utilizar a da low cost irlandesa, como a de qualquer outra companhia, para identificar aos potenciais clientes a identidade da companhia do voo proposto. O uso da marca tem, assim,  uma função meramente descritiva não podendo considerar-se ilícita, ainda que não exista autorização por parte da titular Ryanair.

Para obter informação dos voos a agência, tal como outras on-line travel agents, fá-lo através de uma actividade de screen scraping, rotulada de ilegal pela Ryanair. Considerou, no entanto, o tribunal que  a actividade de constante interrogação dos dados apresentados numa rede não é de per si ilícita, sobretudo se tais dados se destinam a consulta pública, exceptuando naturalmente a violação da propriedade intelectual.

O direito comunitário define a posição dominante como uma situação de poder económico em virtude do qual a empresa que o detém está em condições de obstaculizar a uma concorrência efectiva sobre o mercado e de agir de uma maneira significativamente independente relativamente aos seus concorrentes, clientes e consumidores. A finalidade da disciplina antitrust desdobra-se no desenvolvimento pleno da concorrência no interesse das empresas mas sobretudo em oferecer ao consumidor uma ampla escolha de alternativas. 

Sucede que a empresa low cost detém o monopólio sobre 49 rotas intracomunitárias e uma quota de mercado superior a 50% sobre outras 19, pelo que a decisão comercial de excluir qualquer empresa  na comercialização dos seus voos determina a impossibilidade de os intermediários desenvolverem de forma cabal a sua actividade de agência de viagens.

O tribunal considerou ilícita, por violação do art.º 102º do Tratado de Funcionamento da União Europeia a conduta da Ryanair impedindo aos intermediários  o acesso à sua base de dados e ao processo de reservas.   Os juízes salientaram ainda a lamentável conduta de  recusa de embarque passageiros que adquiriram os seus bilhetes em agências on line e a limitação do conhecimento dos consumidores relativamente a alternativas e serviços de intermediação profissionais.

Foi, assim, declarada ilícita a actuação concorrencial da Ryanair traduzida na divulgação de notícias falsas e descredibilizantes, invocando decisões judiciais favoráveis, em que as agências de viagens on line surgem a revender os bilhetes ao dobro ou triplo do preço e ameaçando publicamente de recusa de embarque os passageiros que não lhe tivessem adquirido directamente as suas passagens.

De harmonia com os juízes da sezione A specializata in materia di impresa do tribunal de Milão, a atitude da Ryanair não permitindo qualquer intermediação na venda dos seus serviços constitui um abuso de posição dominante sobre o mercado das agências de viagens e turismo.


Carlos Torres, Publituris de 23 de Agosto de 2013