Em 14 de Junho de 2013, o tribunal de Milão
(processo 7825/2013) decidiu, duma forma extensa e muito fundamentada, a acção
proposta em 2010 pela Viaggiare
s.r.l., uma agência de viagens on line contra
a companhia aérea Ryanair Ltd.
Alegou a agência de viagens que a sua actividade
é inteiramente legal, não violando qualquer direito
de propriedade intelectual
sobre o site da companhia aérea low cost e
que a pretensão da Ryanair de excluir
qualquer intermediário das informações sobre os seus voos e da sua
actividade comercial é ilícita, configurando ainda abuso de posição dominante sobre o mercado de venda de bilhetes de
avião e de serviços de viagens e turismo ao nível nacional ou comunitário.
Por seu turno,
alegou a Ryanair que a sua competitiva estratégia
empresarial oferecendo aos clientes, com
total segurança, directamente na fonte e sem
pagar comissões a intermediários, foi aprovada pela
Comissão Europeia e pela Irish Competition Authority.
Consideraram os juízes italianos não existir
qualquer violação da marca porquanto
a agência de viagens limita-se a utilizar a da low cost irlandesa, como a de qualquer outra companhia, para
identificar aos potenciais clientes a identidade da companhia do voo proposto.
O uso da marca tem, assim, uma
função meramente descritiva não podendo considerar-se ilícita, ainda que não
exista autorização por parte da titular Ryanair.
Para obter informação dos voos a agência, tal
como outras on-line travel agents, fá-lo através de uma actividade de screen scraping, rotulada de ilegal pela
Ryanair. Considerou, no entanto, o tribunal que a actividade de constante interrogação dos dados apresentados
numa rede não é de per si ilícita, sobretudo se tais dados se destinam a
consulta pública, exceptuando naturalmente a violação da propriedade
intelectual.
O direito comunitário define a posição dominante como uma situação de
poder económico em virtude do qual a empresa que o detém está em condições de
obstaculizar a uma concorrência efectiva
sobre o mercado e de agir de uma maneira significativamente independente
relativamente aos seus concorrentes, clientes e consumidores. A finalidade da
disciplina antitrust desdobra-se no desenvolvimento pleno da
concorrência no interesse das empresas
mas sobretudo em oferecer ao consumidor uma
ampla escolha de alternativas.
Sucede que a empresa low cost detém o monopólio sobre 49 rotas intracomunitárias e uma
quota de mercado superior a 50% sobre outras 19, pelo que a decisão comercial
de excluir qualquer empresa na
comercialização dos seus voos determina a impossibilidade de os intermediários
desenvolverem de forma cabal a sua actividade de agência de viagens.
O tribunal considerou ilícita, por violação
do art.º 102º do Tratado de Funcionamento
da União Europeia a conduta da Ryanair impedindo aos intermediários o acesso à sua base de dados e ao
processo de reservas. Os juízes
salientaram ainda a lamentável conduta de recusa de embarque passageiros que adquiriram os seus bilhetes
em agências on line e a limitação do
conhecimento dos consumidores relativamente a alternativas e serviços de
intermediação profissionais.
Foi, assim, declarada ilícita a actuação concorrencial
da Ryanair traduzida na divulgação de
notícias falsas e descredibilizantes, invocando decisões judiciais favoráveis, em que as agências de viagens on line surgem a revender os bilhetes ao
dobro ou triplo do preço e ameaçando publicamente de recusa de embarque os
passageiros que não lhe tivessem adquirido directamente as suas passagens.
De harmonia com os juízes da sezione
A specializata in materia di impresa do tribunal de Milão, a atitude da Ryanair não permitindo qualquer
intermediação na venda dos seus serviços constitui um abuso de posição dominante sobre o mercado das agências de viagens
e turismo.
Carlos Torres, Publituris de 23 de Agosto de
2013