duminică, 1 iunie 2014

NDC, cláusulas de paridade e dossiers do turismo na União Europeia



“O sistema de distribuição da IATA foi recentemente aprovado, os deputados franceses querem proibir as cláusulas de paridade impostas pelas OTAs à hotelaria e nos dossiers do turismo pós eleições europeias destaca-se a Directiva dos pacotes turísticos e o Regulamento do overbooking, cancelamento e atraso dos voos.”




1) Luz verde para um novo sistema de distribuição

No passado dia  21 de Maio, a autoridade dos transportes dos EUA - Department of Transportation (DOT) - deu a conhecer a sua posição, ainda não definitiva, relativamente ao novo sistema de distribuição directa, sob a égide da IATA, denominado New Distribution Capability (NDC), constante da Resolução 787, aprovada em Outubro de 2012.

Embora ainda decorra o prazo para os interessados se pronunciarem antes da decisão se tornar definitiva, constitui uma vitória da poderosa IATA que consegue luz verde para o seu ambicioso projecto, quando há um ano atrás se perspectivava com elevada probabilidade uma decisão negativa do DOT, que feriria de morte o NDC.

Em bom rigor,  as  quatro centenas de posições críticas apresentadas ao DOT, há um ano atrás, dirigiam-se a um modelo substancialmente diferente do actual compreendendo-se, assim, não só o entusiasmo da IATA mas também o agrado de outros interessados outrora críticos, designadamente a ASTA, os GDS e ainda a Travel Technology Association que agrupa Sabre, Travelport, Amadeus, Expedia, Orbitz e Priceline. 

Um dos factores que pesou na mudança foi a evolução de um sistema privativo da IATA que excluía agentes de viagens e GDS para um aberto sistema standard usado pelos rent-a-car e parte da indústria hoteleira nos EUA (Standard Open AXIS). Os GDS  foram chamados a colaborar no NDC e as agências de viagens vêm com agrado a manutenção de alguns dos serviços extras que actualmente figuram nos GDS.

A segurança dos dados dos clientes foi fundamental para a autoridade dos transportes norte-americana, porquanto a versão inicial do NDC pretendia valorizar as tarifas em razão do poder aquisitivo do cliente (por exemplo através da residência de luxo, viaturas topo de gama, cartões de crédito com elevado plafond, clubes com quotas elevadas) sendo um dos aspectos destacadamente referidos na decisão do DOT o carácter anónimo da consulta ao sistema.

Uma lição para alguns irredutíveis negociadores lusos pois até a poderosa IATA se viu compelida a uma postura negocial inclusiva, chamando para o novo modelo agentes de viagens, GDS e outros prestadores de serviços. Uma evolução notável no espaço de um ano, partindo-se de um modelo de distribuição privativo da aviação para um aberto modelo standard que respeita os dados e a privacidade dos consumidores do transporte aéreo, não alterando o modelo de negócio dos GDS e agentes de viagens.


2) Projecto de lei proibindo cláusulas de paridade

Depois de no ano passado a Commission d’Examen des Pratiques Commerciales (CEPC) da Assembleia Nacional francesa ter versado a matéria,  um grupo de deputados franceses apresentou, em 14 de Maio último, um projecto de lei que visa enquadrar os métodos praticados pelas OTAs, disciplinando as cláusulas de paridade tarifária também denominadas paridade de preços ou de garantia do melhor preço.

Na exposição de motivos os deputados subscritores fazem notar a importância do sector, o desenvolvimento de novas ferramentas digitais que revolucionaram a hotelaria francesa que representa um volume de negócios de € 17 000 milhões  num universo 17.000 hotéis, em média 1 milhão de euros por hotel. Actualmente  cerca de 50% das reservas são feitas pela  internet, metade das quais através de OTAs, uma tendência em crescendo. Duas empresas americanas dominam totalmente o mercado - Priceline e Expedia - impondo cláusulas manifestamente desequilibradas, sem possibilidade de negociação por parte das entidades exploradoras dos hotéis, as quais podem configurar práticas anticoncorrenciais.

Face ao entendimento doutrinário de que é possível prever na lei a interdição das cláusulas de paridade de preços, em razão do desequilíbrio significativo que introduzem, os deputados propõem uma nova redacção da alínea d)  artigo L 442-6 do Code de Commerce que estatui a nulidade das cláusulas pelas quais uma das partes “beneficie automaticamente de condições mais favoráveis concedidas a empresas concorrentes ou ao conjunto dos distribuidores concorrentes bem como organizar um enquadramento tarifário paritário que tenha por objecto ou que possa ter por efeito eliminar a concorrência de preços entre todos os distribuidores.”.


3) Eleições europeias e os dossiers do turismo

Com as eleições de um novo Parlamento Europeu e do novo presidente da Comissão Europeia retomam-se os principais dossiers do turismo.

Em primeiro lugar, a substituição da Directiva dos pacotes turísticos , que apesar de o Parlamento Europeu ter votado em 12 de Março de 2014 - 610 votos a favor, 58 contra e 13 abstenções -  a proposta da Comissão Europeia para modernizar as regras comunitárias em matéria de férias organizadas, ainda existem vários aspectos em discussão, designadamente a repartição de responsabilidades entre o organizador e o distribuidor da viagem, o custo da assistência em caso de força maior ou as implicações dos atrasos.  A discussão pode, no entanto,  alargar-se consideravelmente porquanto o novo Parlamento Europeu não está vinculado pelos relatórios da anterior legislatura, podendo continuar os trabalhos ou  reiniciar os mesmos.

Em segundo lugar, a revisão do Regulamento 261/2004, que estabelece regras sobre os direitos dos passageiros do transporte aéreo em caso de overbooking, cancelamento ou atraso dos voos. Um corpo de normas tentando alcançar o  difícil equilíbrio entre uma maior protecção dos passageiros do transporte aéreo e a competitividade das empresas sem descurar os aspectos da concorrência porquanto algumas companhias aéreas assumem esses custos, como é o caso da TAP, e outras, violando sistematicamente os direitos dos passageiros, deles se eximem.

Na revisão da Directiva sobre mediação de seguros discute-se a eventual inclusão dos seguros vendidos por agências de viagens no âmbito dos produtos turísticos por elas comercializados – é o caso dos pacotes turísticos em que devem informar o consumidor para a possibilidade de contratar um seguro opcional que cubra despesas resultantes da rescisão e de um contrato de assistência que cubra as despesas de repatriamento em caso de acidente ou de doença – implicando maiores deveres de informação aos clientes, modificação das regras de responsabilidade civil e formação até 200 horas.

O Regulamento sobre vistos no espaço Schengen será outra das matérias em debate na União Europeia.

Carlos Torres, Publituris de 30 de Maio de 2014